Crítica | Mulher Maravilha


Patty Jenkins e Gal Gadot colocam o universo estendido da DC de volta aos trilhos 


🎬 :★★★★


Direção: Patty Jenkins • Roteiro: Allan Heinberg • Produção: Charles Roven, Deborah Snyder, Zack Snyder, Richard Suckle •


Elenco: Gal Gadot, Chris Pine, Robin Wright, Danny Huston, David Thewlis, Connie Nielson, Elena Anaya, Lucy Davis, Said Taghmaoui, Ewen Bremner, Eugene Brave Rock


Por
Walther Júnior 


O aguardado quarto filme do Universo Cinematográfico estendido da DC e o último a ser lançado antes de “Liga da Justiça”, e sim, repleto de ação, Mulher-Maravilha é uma história de origem emocionante que tirou a DC de sua rotina cinematográfica. Após a recepção controversa de Batman Vs Superman: A Origem da Justiça (2016), todos os olhos se voltaram para o primeiro filme de super-heróis feminino da DC. A expectativa de sua estreia era grande, pelo fato de que a Mulher Maravilha é a maior heroína da DC e seria dirigido pela talentosa Patty Jenkins.


Há sempre uma polêmica (desnecessária) quando um grande projeto como esse é anunciado. Principalmente quando uma adaptação de quadrinhos desse porte é dirigida por uma mulher, em grande parte devido ao preconceito (não assumido) por parte do público “geek" que, por vezes, tem um lado, digamos, um pouco mais patriarcal.  Além disso, o hate recente em relação a qualquer mídia que se afaste da caracterização hétero, rico, branco e masculino (vide Caça-Fantasmas em 2016), colocaram mais pressão ainda em Mulher Maravilha, pois, se o filme fracassasse, poderiam culpar a diretora e a discussão de gênero que está em alta hoje em dia. Mesmo que essa parcela do público não se lembre do feminismo pioneiro na história da Mulher-Maravilha.

Mas, calma!  

Fracasso é tudo que Mulher-Maravilha, NÃO é!


Treinada desde cedo para ser uma guerreira imbatível, Diana Prince nunca saiu da paradisíaca ilha de Temyscira em que é reconhecida como princesa das Amazonas. Quando o piloto Steve Trevor se acidenta e cai numa praia do local, ela descobre que uma guerra sem precedentes está se espalhando pelo mundo e decide deixar seu lar, certa de que pode parar o conflito. Lutando para acabar com todas as lutas, Diana percebe o alcance de seus poderes e sua verdadeira missão na Terra.



O filme oferece uma compreensão inteiramente nova do que significa ser um herói (heroína), que já foi visto em qualquer filme de ação na DC. Com a Primeira Guerra Mundial como pano de fundo, Mulher-Maravilha envolve uma exploração intrincada e aprofundada do bem e do mal sem recorrer à separação binária dos dois. Ao invés de posicionar a presença do mal como uma expressão inata que não pode ser combatida, e a bondade tão pura e ingênua, como algo sem a propensão para o engano, o discurso temático de Mulher Maravilha é que a humanidade é uma fusão dos dois. 


Isso vai além da explicação habitual da vilania como uma característica provocada por maus tratos, e abre o diálogo que, mesmo que o que está sendo feito seja acreditado, as ações ainda podem prejudicar. Isso é arruinado em um momento pungente em que Steve diz a Diana que a violência da guerra também está em sua cabeça, apesar de sua objeção à luta e um anseio exausto para acabar com a sangrenta batalha. Desta forma, o filme comunica que toda a violência - seja ela epistêmica ou física - ocorre como parte de um espectro e, se as intenções por trás das ações são puras ou não, a responsabilidade é de quem causa os danos.


O filme também aborda a natureza performativa das hierarquias estruturais sociais da época. Tendo sido criada em uma ilha cheia de mulheres, Diana luta contra o choque cultural da sociedade patriarcal da Londres do início do século 20. Como na cena da loja de roupas , quando, ela olha para os espartilhos e o veste com certa confusão, perguntando: "Isso é uma armadura? Como as mulheres lutam nisso? "A secretária de Steve, Etta (Lucy Davis), uma sufragista fica maravilhada com Diana, e responde" usando nossos princípios”. Ela enxergou Diana como um exemplo, uma liderança, e aí, reside à importância do longa, o poder de identificação. As maneiras com as quais Diana lida com as restrições do patriarcado são engraçadas e igualmente importantes. Mesmo sendo ingênua, a Mulher Maravilha não é tola e muito menos fraca. Se não existe um motivo claro e justificável para que uma mulher faça algo, ela dirá NÃO. Bem simples e direto. O filme é feminista sem levantar bandeira.





Mas o filme não fica nisso, a coreografia das cenas de ação são primorosas e muito bem filmadas. Ver o balé das amazonas é uma experiência fantástica, assistir as mulheres lutando, cortando corpos com espadas, jogando laços, penduradas nos penhascos e lançando suas flechas me parece muito mais gloriosa do que as cenas com os homens. A cena na praia já é uma das minhas preferidas nos longas da DC/Warner. E a caracterização das Amazonas também foi outro acerto, mostrando mulheres fortes, não só fisicamente, mas com extrema atitude. Os destaques são a General Antíope (Robin Wright) e a Rainha Hipólita (Connie Nielsen).  Ponto para a direção.


A diretora Patty Jenkins (que muitos não engoliram) faz um trabalho maravilhoso (com o perdão do trocadilho), apesar da imensa pressão sobre seus ombros. Ela entrega um filme que prova que, mesmo em um gênero tão repetitivo quanto este (super- heróis) pode surpreender e encontrar boas respostas em cada variável possível. Jenkins trabalha bem as cenas de ação e também aquelas cuja as interações dos personagens são importantes. Não é a toa que, seus colegas diretores são só elogios a ela.


O mesmo pode-se dizer de Gal Gadot que é a alma do filme. E aqui, faço um mea culpa... Quando Gadot foi anunciada como a nova Mulher Maravilha, fui um ,dos que não gostou da escolha. Na época tinha em mente a atriz Jaimie Alexander (a lady Sif dos filmes do Thor), ainda acho que ela é mais parecida fisicamente com a personagem. Até que, como muitos, fui impactado com a chegada de Gadot em “Batman Vs Superman”, até hoje aquela cena me arrepia. Gal me ganhou pelo sorriso e entrega a personagem, a mais icônica da DC. No filme ela luta contra a verdade da guerra moderna que mata inocentes em todos os lados e o mal que se encontra dentro de todos os corações humanos.  E por vezes ela fica furiosa com os homens por ficar de pé e optar por não fazer nada em relação a isso. É aqui que Gadot brilha.


Outro destaque do longa é o espião americano Steve Trevor (Chris Pine) que atua em diversas áreas, servindo como par romântico, alívio cômico e a chave para a saída de Diana da Ilha e sua entrada na guerra. Trevor chega a roubar algumas cenas, mas não se esqueçam é Diana quem brilha mais do que um diamante. Aliás, o Steve de Chris Pine é sem dúvida o par perfeito para Diana. Ele é a “Lois Lane” de dela. Ele é salvo por ela várias vezes, mas também, muitas vezes, ele move a história para frente, a química entre Gadot e Pine é explosiva e uma das melhores coisas do filme. Suas tentativas de tentar entender os mundos uns dos outros deram ao filme momentos de risadas leves e seu romance trouxe um frescor ao gênero, uma história de amor que você realmente deseja ver. Por vezes, me lembrou do “Superman” de 1978.


A trilha sonora é empolgante e acompanha o tom frenético do filme, contando também com a faixa “Is She With You?”, tema da personagem apresentada em “Batman Vs Superman”, que juntamente com as  belas cenas de ação,permite ao espectador se aprofunda na ótima experiência cinematográfica. O cuidado técnico é visto na fotografia do longa, a ilha de Temiscira, a cidade das Amazonas, é deslumbrantemente rica muito viva, com céu azul, sol brilhante, muito verde e lindas paisagens naturais em contraste com o clima sombrio e frio da cidade de Londres da primeira guerra. O longa é um contraponto direto aos filmes anteriores que tinham uma paleta de cores escuras e um cinza pesado, o filme da princesa amazona é bem mais leve e otimista. 


O filme, no entanto, contém uma falha. O clímax é a minha maior queixa com a longa. Mesmo com todas as coisas que conseguiu, infelizmente, Jenkins teve de ceder às pressões dos produtores que tem obsessão por coisas gigantes (se é que me entendem!). Eles deveriam ter aprendido uma lição com o 3º ato de “Batman Vs Superman”. O ponto fraco reside na rápida e não muito bem explicada inserção do vilão na trama, Ares, o Deus da Guerra. Mais uma vez, a culpa não é de Jenkins e sim dos produtores. Fora esse deslize, o filme é bom e mostra que a Mulher Maravilha é o herói ou heroína que você tem vontade de se espelhar.


A tal “maldição da DC” parece ter desaparecido, finalmente. A história de origem de seu super-herói feminino mais popular, Diana Prince / Mulher Maravilha, é impressionante e magistral. Resta saber se o nível de qualidade será mantido nos próximos projetos e, não importa se você é fã da DC ou da Marvel, o que importa é que possamos continuar a ver nossos heróis no cinema, independente de gênero.

Nos vemos nos cinemas.



Assista ao Trailer : 




Trilha "Is She With You ? " :


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